Psicologia |
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Livro: Quem sou eu?
Autor: Deolino Pedro Baldissera
Psicologia e Você
Editora: Paulinas
Aspecto fenomenológico :
1.
O aspecto fenomenológico a' que me refiro aqui é simplesmente a
primeira forma de autoconhecimento que temos de nós mesmos ou dos outros. Isto
é, aquilo que nos aparece diante dos olhos. Quando vemos alguém pela primeira
vez, imediatamente fazemos uma idéia dele, ainda não muito precisa e profunda.
Essa idéia é frequentemente superficial, pois é
apenas impressionística. É a percepção que temos da
pessoa, com todas as' distorções possíveis causadas seja por nossas próprias
distorções ou por aquelas que o sujeito emite para nós.
2.
Ao ver uma pessoa diante de nós, associamo-la, consciente ou
inconscientemente, com aspectos já conhe¬cidos por nós ou a serem decifrados. O
fato é que uma primeira idéia do sujeito é formada dentro de nós. Ele passa a
morar em nossa mente como um fenómeno novo captado
por nós. Neste primeiro momento, esse fenômeno pode-se revestir de uma imagem
simpática, atraente, que desperta em nós desejo de
aproximação e troca de feedback. Há outras pessoas que, ao serem percebi¬das,
nos causam impressões que nos despertam medo ou desejo de distanciamento e até
de antipatia.
3.
Esse aspecto fenomenológico é formado, pois, por diferentes
"visões" por nós captadas. Alguém pode
cha¬mar nossa atenção pela sua altura, por sua gordura, pela cor de seu cabelo,
pelo traje que veste, pelo olhar que tem, pelos gestos que faz, pela maneira de
reagir diante das situações que aparecem, pelas reações que tem quan¬do movido
por alguma emoção. Sua face normal pode, num momento, tornar-se enrubescida
pela vergonha ou medo que experimentou. Enfim, esse fenômeno que se apresenta à
nossa percepção pode ser observado e interiorizado, formando imediatamente
dentro de nós um tipo de conhecimento que vamos ter deste indivíduo, de forma
que podemos até reconhecê-lo imediatamente numa segunda vez que o vemos. Muitas
vezes, essa imagem fica tão impressa dentro de nós, que será difícil mudá-la. E aqui o provérbio conhecido se confirma: "é a
primeira impressão que fica". Se essa impressão não for aprofundada,
certamente ocorrerá isso mesmo, será essa a impressão que teremos de tal
pessoa, e somos levados a estabelecer com ela um tipo de relacionamento marca¬do
por tais impressões.
4.
Estas podem ser interiorizadas nem sempre de ma¬neira objetiva. Frequentemente, são afetadas por,
pelo menos, dois tipos de condicionamentos prévios.
5.
Um primeiro é causado pela nossa maneira distor¬cida de ver as pessoas,
pois nelas podemos projetar nos¬sos próprios problemas e conflitos e ver-nos
como que no espelho delas.
6.
Um segundo condicionamento pode ser causado pela maneira distorcida com
que o outro se apresenta diante de nós.
7.
Isto é, com suas máscaras, seus fantas¬mas, que não nos permitem ver o fenómeno que ele realmente é. E assim formamos dele uma
imagem distorci¬da, porque ele se escondeu de nós e nossos "olhos"
não foram além do visual distorcido apresentado.
8.
Como podemos constatar, esse aspecto
fenomenológico, embora aparentemente simples, está ligado aos demais aspectos
que ainda.veremos. Porém, não deixa de ser um tipo de conhecimento que muitas
vezes permanece como se fosse o único referente à pessoa em questão.
9.
Dentro desse aspecto, podemos ainda considerar os dados de natureza,
isto é, aquilo que o indivíduo traz consigo como
característica de uma raça: sua cor, seus costumes, suas tradições. É frequente imaginarmos uma pessoa de uma raça X ser
portadora de certos jeitos de ser. No sul do país, por exemplo, quando se fala
de um alemão, já se imagina seus traços de caráter e o modo como enfrenta a
vida; o mesmo se dá quando se fala de um italiano: logo vem à mente das pessoas
um estereóti¬po que antecede à pessoa como tal. Já "sei" quem é o
sujeito apenas sabendo que ele é de origem alemã ou italiana! Esse
"conhecimento" baseia-se no imaginário que formamos a partir do
conhecimento que se tem de outros membros daquela raça. Talvez Jung diria que é um arquétipo da raça que a caracteriza assim.
10.
O conhe¬cimento, portanto, baseado no aspecto fenomenológico, incorre
em parcialidades que não traduzem a complexi¬dade da pessoa que imaginamos
conhecer. Nós costu¬mamos dizer que "as aparências enganam" e, nesse
sentido, não basta conhecer o aspecto fenomenológico como garantia para se
dizer: "conheço fulano de tal". São ape¬nas indícios que nos devem
levar a uma busca mais pro¬funda para chegarmos mais perto de decifrar o enigma
que cada um é. Já dizia o poeta Carlos Drumond de
An¬drade no poema "O outro": Como decifrar pitogramas
de dez mil anos atrás se nem sei decifrar minha escrita interior (...) a
verdade essencial é um desconhecido que me habita e a cada amanhecer me dá um
soco...